Ventilação Mecânica na Bronquiolite Viral Aguda


Eventualmente, a bronquiolite pode ter uma evolução ruim, em que a criança necessita de suporte ventilatório não invasivo e, nos casos mais graves, intubação orotraqueal e ventilação mecânica para assegurar níveis adequados dos gases arteriais e para reduzir trabalho respiratório. Nessa situação, o prognóstico da criança é mais reservado e estará na dependência do tempo de ventilação mecânica, na necessidade de se utilizar altas pressões e altas frações inspiradas de oxigênio e na associação de outras morbidades.
Quando se fala em bronquiolite, imediatamente deve-se associar o seu caráter obstrutivo. Talvez esta seja uma das doenças respiratórias da infância que mais freqüentemente curse com obstrução das vias aéreas.

Na maioria dos casos, os quadros de insuficiência respiratória gerados em função da bronquiolite são revertidos com a utilização da oxigenoterapia, a qual é responsável pela minimização da hipoxemia e, conseqüentemente, do próprio desconforto respiratório.
Quando há a associação da taquipnéia com elementos que nos dão sinais de que a criança está evoluindo com desconforto respiratório (tiragens, batimento de asa de nariz, gemência, sudorese fria, balanceio de cabeça, cianose e/ou respiração paradoxal), deve-se pensar em se lançar mão do suporte ventilatório não invasivo. Como a faixa etária comumente acometida pela doença oscila de zero a 1-2 anos de idade, há a indicação da utilização da CPAP (Pressão Positiva Contínua nas Vias Aéreas), com prong nasal, especialmente se considerarmos que crianças até os 6 meses de vida (período em que há uma maior incidência desta doença) assumem uma respiração estritamente nasal. Usa-se, inicialmente, um valor pressórico dentro do limite fisiológico (5 cmH2O), com oxigênio suplementar suficiente para garantir uma saturação periférica de oxigênio maior ou igual a 90%. O valor da CPAP pode ser elevado até cerca de 10 a 12 cmH2O, tolerando-se níveis de até 0,6 como fração inspirada de oxigênio (FiO2). Contudo, tais valores elevados são indicativos de IOT e assistência ventilatória invasiva, caso a criança não seja capaz de manter níveis adequados dos gases sangüíneos arteriais. Vale lembrar que, com a utilização da CPAP, é possível manter as vias aéreas terminais abertas, o que garante uma melhora da relação ventilação-perfusão, reduz o shunt intrapulmonar e, conseqüentemente, diminui a hipoxemia. Isso é possível também com a associação de uma FiO2 mais elevada. Mesmo com estes elementos que falam favoravelmente em relação à utilização da pressão positiva, não se pode esquecer que, pelas características fisiopatológicas da doença, bem como pela própria anatomia peculiar das vias aéreas dos lactentes com aumentos excessivos do nível pressórico (CPAP), e com o próprio aumento da freqüência respiratória surgido pelo desconforto respiratório e pelo quadro obstrutivo, pode-se estar provocando a ocorrência da auto-PEEP (Pressão Positiva Expiratória Final). Tal fenômeno pode trazer transtornos ventilatórios graves, além de descompensação hemodinâmica, agravando ainda mais o prognóstico do bebê. Nem sempre se consegue um resultado satisfatório e a reversão do desconforto respiratório. Aí, então, indica-se a IOT e a ventilação mecânica invasiva.
Na maior parte das Unidades de Terapia Intensiva Neonatal e Pediátrica, a modalidade ventilatória de escolha para se ventilar crianças com doenças obstrutivas é a IMV (Ventilação Mandatória Intermitente), a qual tem particularidades como a de limitar a pressão, ser ciclada a tempo e possuir um fluxo contínuo. Entretanto, há serviços que, para tentar garantir um volume corrente constante, independente de qualquer alteração na resistência das vias aéreas, optam pela ventilação com volume controlado. Essa preocupação decorre do fato de que as variações no componente resistivo das vias aéreas durante a evolução desta doença são freqüentes e podem levar a significativas mudanças no volume corrente.

Inicialmente, ao se instituir o IMV, deve-se cuidar para que a pressão inspiratória (Pico de Pressão Inspiratória) seja mantida abaixo da pressão de platô, que corresponde a 35 cmH2O, podendo chegar até a 40 cmH2O, quando há um aumento excessivo da resistência das vias aéreas. É comum a decisão pela estratégia ventilatória que aceita a hipoventilação com hipercapnia permissiva (até 80 a 100 mmHg desde que o pH esteja acima de 7,2) a fim de que se possa limitar o PIP a níveis inferiores a 40 cmH2O, minimizando-se a possibilidade de barotrauma.
O volume corrente efetivo deve oscilar entre 7 e 8 ml/kg, considerando-se sempre uma pressão de platô correspondente menor que 35 cmH2O. Assim, verifica-se a importância da monitoração do volume corrente e do próprio volume minuto, os quais estarão na dependência da impedância do sistema respiratório da criança (complacência e resistência) e do nível pressórico ofertado.
Quando da instalação da ventilação mecânica invasiva, deve-se optar pela instituição da PEEP fisiológica de 5 cmH2O, não se esquecendo de que a monitoração da auto-PEEP é relevante nas doenças obstrutivas. O uso da PEEP elevada ainda é extremamente discutido em se tratando de quadros obstrutivos, justamente pela possibilidade de surgir a auto-PEEP, tão temida pelas complicações ventilatórias e hemodinâmicas que podem ser originadas para ela. Quando se eleva o nível de PEEP, pode-se reduzir as microatelectasias originadas pelos tampões de muco. Assim, minimiza-se o shunt intrapulmonar e otimiza-se a relação ventilação-perfusão e reduz-se a hipoxemia. Mesmo que esta estratégia possa ser a única possibilidade durante a evolução da doença, não se pode esquecer de que para se ter segurança durante a realização deste procedimento, é necessário fazer a monitoração contínua da auto-PEEP e dos demais parâmetros ventilatórios em geral.

A freqüência respiratória inicial deve ser preferencialmente baixa (cerca de 8 a 16 incursões por minuto), com um tempo inspiratório normal para a idade e um tempo expiratório bem mais alto, pelo menos cerca de 2 a 3 vezes o tempo inspiratório. Esta estratégia deve ser considerada, pois, como há um aumento da resistência expiratória, há um aumento na constante de tempo ou um tempo maior para o esvaziamento dos pulmões. Assim, a relação inspiração-expiração (I:E) deve ser de, pelo menos 1:2 ou 1:3 ou até mais, a fim de que se possa garantir um maior tempo expiratório, reduzindo-se o aprisionamento de ar. Vale ressaltar que, como geralmente as crianças encontram-se com um importante aumento da freqüência respiratória, para que se consiga ventilá-las de acordo com a estratégia proposta acima, elas deverão ser sedadas e, eventualmente, curarizadas.
O fluxo inspiratório deve ser ajustado de acordo com a idade do paciente, mas principalmente, nestes casos, deve-se considerar fluxos altos para atender à demanda do paciente.
Já a FiO2 deve ser ajustada para que se alcance uma saturação de oxigênio maior ou igual a 90%. E, assim que possível, manter valores inferiores a 0,6, a fim de que se possa evitar os efeitos deletérios dos altos níveis deste gás, pela liberação de radicais livres, etc.

O Consenso de Bronquiolite (2000) prega que excepcionalmente são observadas seqüelas anatômicas como bronquiolite obliterante e bronquiectasia. Não se pode esquecer de que aquelas crianças que ficaram sob intubação orotraqueal (IOT) e/ou VMNI têm mais chance de desenvolver seqüelas anatômicas pulmonares, como as citadas acima, pelo próprio desenvolvimento de um pulmão com displasia. Assim, fica claro que uma intervenção fisioterapêutica precoce pode prevenir a morbidade que está associada a esta doença, reduzindo tempo de IOT e ventilação mecânica, tempo de internação hospitalar e minimizando o ônus despendido para o tratamento deste grupo de pacientes.
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